Título: Adauto confessa que sempre usou caixa 2
Autor: Gilse Guedes
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/11/2005, Nacional, p. A10

Ex-ministro diz na CPI que as 9 eleições que enfrentou tiveram recursos 'por fora'

ESCÂNDALOS: A passagem de Anderson Adauto pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva - entre janeiro de 2003 e abril de 2004 - foi marcada por constrangimentos. Na primeira semana como ministro dos Transportes, ao tomar conhecimento da precariedade em que se encontravam muitas rodovias, ele cometeu a gafe de apelar aos cidadãos para que não viajassem pelo País. Na segunda semana, os brasileiros tomaram conhecimento, por meio de reportagem da IstoÉ, que o ministro era acusado pela Justiça Eleitoral de desviar recursos da prefeitura de Iturama - na época em que era dirigida por Aelton José de Freitas, correligionário de Adauto no PL. Lula ignorou o imbróglio e manteve o ministro. Quem caiu foi o assessor dele, Sérgio de Souza, cujo nome também aparecia no escândalo. Foi a primeira baixa no governo Lula. Em 2004, quando figurava em todas as listas de ministros em processo de fritura pela Presidência, ele pediu demissão e foi candidato vitorioso à Prefeitura de Uberaba. Neste ano, com o estouro do escândalo do mensalão, voltou à cena nacional: apareceu como um dos beneficiários do valerioduto, tendo sacado dinheiro nas contas do empresário no Banco Rural. O ex-ministro admitiu que pediu ajuda ao PT para quitar dívidas de sua campanha a deputado federal em 2002. Teria recebido R$ 200 mil. Pelas contas de Marcos Valério, no entanto, o montante chega a R$ 1 milhão. Antes de chegar ao ministério, Angelo foi deputado estadual pelo PMDB e presidente da Assembléia de Minas. Bandeou-se para o PL em 2002, após desentender-se com o então governador Itamar Franco. Gilse Guedes Roldão Arruda BRASÍLIA O ex-ministro dos Transportes no governo Luiz Inácio Lula da Silva e prefeito de Uberaba, Anderson Adauto, admitiu ontem, em depoimento à CPI do Mensalão, que durante toda a sua vida política sempre recorreu ao caixa 2. "Eu fiz e todo mundo faz isso", declarou. E foi além: "Eu sei que poderia muito bem ter resolvido os meus problemas de campanha com os fornecedores do Ministério dos Transportes. É claro que eu sabia disso." Mas fez questão de frisar: "Eu sabia que poderia, mas não fiz."

Adauto classificou de "cínicos" os políticos que negam o caixa 2. "Não quero sair daqui como único deputado que fez caixa 2", disse. Ele contou aos integrantes da CPI que recebeu R$ 410 mil do PT depois de pedir ao então tesoureiro petista, Delúbio Soares, ajuda para quitar dívidas da campanha de 2002, na qual se elegeu deputado.

"Em todas eleições você fica com dívida para trás. Isso é natural. Eu fechei a campanha de 2002 como fechei as outras oito campanhas que disputei", afirmou Adauto, que também admitiu o uso de recursos "não contabilizados" em duas eleições em que foi coordenador.

"Não quero me eximir da responsabilidade, mas é cinismo quem disser que não é assim. É claro que isso é irresponsabilidade, mas eu estou pagando por isso", disse. Ele afirmou que, em nenhum momento da negociação com o PT, soube da origem dos recursos. "Quando a gente pede um empréstimo, por elegância, a gente não pergunta de onde vem."

Adauto negou, porém, que tenha recebido R$ 1 milhão, conforme a lista apresentada à Polícia Federal pela diretora financeira da SMPB, Simone Vasconcelos, funcionária do publicitário Marcos Valério de Souza. Segundo Simone, o então assessor José Luiz Alves, que trabalhava com Adauto no ministério, recebeu R$ 1 milhão.

PARCELAS

"Recebi R$ 410 mil. É isso que direi ao Ministério Público. Eu não confirmo a lista. O ônus da prova compete a quem acusa", disse o prefeito, dirigindo-se aos parlamentares da CPI.

Segundo o ex-ministro, o dinheiro foi entregue pelo PT, para o pagamento de suas dívidas, em duas parcelas. A primeira foi entregue a José Luiz Alves e R$ 210 mil a seu irmão Edson Pereira de Almeida. Ele considerou natural pedir dinheiro a Delúbio, porque era ministro dos Transportes de um governo do PT. Acrescentou que queria quitar suas dívidas de 2002, porque não ficaria bem para um ministro manter débitos de campanha.

A deputada Zulaiê Cobra (PSDB-SP), integrante da CPI do Mensalão, afirmou que o ex-ministro pode sofrer as conseqüências de ter praticado crime eleitoral. "Ele pode ser cassado, processado e até ir para a cadeia", afirmou a tucana.