Título: Ata sinaliza corte de 0,5 ponto
Autor: Célia F, Francisco A, Rita T, Marcelo R e Vera D.
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/09/2005, Economia & Negócios, p. B3

A ata do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem, reforçou as expectativas de um corte de 0,5 ponto porcentual na taxa de juros em outubro. "A ata não tem nada de alarmista, o que confirma a expectativa de um quadro de tranqüilidade para 2006", disse o economista-chefe da Itaú Corretora, Guilherme da Nóbrega. "O quadro de médio prazo é de juros em baixa." Nóbrega espera quedas de 0,5 ponto porcentual também em novembro e dezembro, o que levaria a taxa Selic para 18% ao ano no fim de 2005. A maioria dos analistas achou que a ata abre caminho para mais cortes. Alguns, porém, acreditam que o tom positivo não significa uma redução mais vigorosa na Selic e o Copom pode optar por um corte de apenas 0,25 ponto porcentual na próxima reunião. Para grande parte dos economistas, um ponto mencionado na ata, que sinaliza para a queda progressiva da Selic, foi a promoção do reajuste dos combustíveis antes da realização da reunião do Copom, o que contribuiu para retirar as incertezas sobre a inflação neste e no próximo ano.

A observação, na ata, de que o hiato do produto está se ampliando também sinaliza uma trajetória de queda. O hiato do produto é a diferença entre o nível máximo de produção que a economia pode atingir sem causar pressões inflacionárias e a produção de fato. Se existe hiato, significa que há capacidade ociosa para acomodar um aumento de produção sem provocar remarcações de preços. "A melhora deveu-se fundamentalmente à surpresa positiva na inflação de agosto, ao alargamento do hiato do produto e à reavaliação das estimativas de reajustes de alguns preços administrados para o restante do ano (...)," diz a ata.

Para o estrategista-chefe do BNP Paribas, Alexandre Lintz, o BC mostrou que vê equilíbrio entre a oferta e a demanda e esse é um fator positivo para a inflação. "O BC colocou claramente que, apesar do PIB forte do segundo trimestre, não há risco para a inflação", afirmou.

De acordo com o estrategista, essa avaliação da autoridade monetária está clara no parágrafo 18: "A atividade continuará em expansão, mas em ritmo condizente com as condições de oferta, de modo a não resultar em pressões significativas sobre a inflação".

INDÚSTRIA

Para Boris Tabacof, diretor do Departamento de Economia do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), a ata indica um caminho para a queda dos juros nos próximos meses. Ele espera redução de um ponto porcentual na taxa Selic já na próxima reunião do Copom, no mês que vem, abrindo caminho para fechar dezembro em 17%. Descontando a inflação de 5% prevista para o ano, a taxa de juros reais ficaria em 12%.

"O BC chegou aonde queria, atingiu a meta de inflação. Então, vamos deixar de lado o superconservadorismo e cuidar do crescimento econômico", afirma Boris Tabacof.

Para o diretor do Ciesp, a mudança daria ânimo para os empresários investirem. "Teria um efeito salutar na economia e não despertaria pressão inflacionária porque o que verdadeiramente derruba a inflação é a expectativa de investimentos."

Já o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, divulgou nota apontando contradição do Copom, que, segundo ele, ignorou em sua ata a influência que a taxa supervalorizada de câmbio tem exercido no controle da inflação.

"Mais uma vez, o Copom sequer toca na possibilidade de, em médio prazo, o real registrar desvalorizações significativas. Se essa possibilidade tivesse sido levantada, então não seria possível concluir, como consta da ata, que as incertezas e riscos para o controle de preços estariam em queda. Encontra-se aí uma contradição", aponta o presidente da Fiesp.

Para Paulo Skaf, a taxa de câmbio atual não é sustentável no longo prazo. A questão, assinala, é a velocidade com que o dólar vai retornar a um nível mais elevado, o que poderá ocorrer em 2006 ou 2007. "Ao contrário do que afirma a nota, o risco de instabilidade inflacionária persiste, suscitando a manutenção das incertezas".

COMÉRCIO

O comércio e as financeiras não se surpreenderam com a ata do Copom, mas acreditam que o anúncio de um cenário favorável para a continuidade de queda dos juros pode favorecer o consumo.

"A taxa real de juro continua pornográfica, mas, do ponto de vista psicológico, a ata do Copom é positiva porque não tem ameaças para o consumidor", diz o presidente da Associação Comercial de São Paulo, Guilherme Afif Domingos.

Para o presidente da Acrefi, entidade que representa as financeiras, Érico Ferreira, a sinalização do Copom mostra um "céu de brigadeiro". "Não surpreendeu, mas sem dúvida o quadro favorável deve contribuir para um aumento do consumo."

Em relação à queda das taxas de juros, ele comentou que as financeiras se orientam muito mais pelo mercado futuro do que pela Selic. "Por esse motivo, antes mesmo de o Copom reduzir a taxa Selic, elas já haviam se antecipado e cortado juros no mês passado."