Título: Bancos ligados a Valério receberam R$ 600 milhões de fundos de estatais
Autor: Alexandre Rodrigues, Alaor Barbosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/07/2005, Nacional, p. A7

BMG, Rural e Santos seriam compensados com aplicações de fundos de pensão

RIO - Os bancos que estão no centro da crise política gerada pela relação do PT com o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza são o destino de investimentos de quase todos os fundos de pensão de estatais. O exame das aplicações dos fundos nos bancos BMG, Rural e Santos, cujas relações com o publicitário e o PT estão sendo examinadas pela CPI dos Correios, serão, provavelmente, um dos próximos passos dos parlamentares. Um dos alvos da metralhadora giratória do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), os fundos carregam a suspeita de compensar, com parte de suas aplicações financeiras, os bancos que concederam empréstimos milionários ao PT, através de Valério.

Levantamento feito pelo Estado, a partir das informações fornecidas pelos próprios fundos, mostra que esses três bancos receberam pelo menos R$ 600 milhões deles, cujos gestores não levaram em conta os riscos de aplicar em bancos considerados de segunda linha. Um deles, o Santos, foi liquidado este ano, levando milhões do patrimônio dos participantes.

Entre os fundos que mais investiram nessas instituições está a Fundação Real Grandeza, dos funcionários de Furnas. No fim do ano passado, 12,08% dos investimentos da fundação estavam concentrados nos bancos Santos (R$ 151,2 milhões), Rural (R$ 148 milhões), BMG (R$ 98,6 milhões), Mercantil do Brasil (67,4 milhões) e Panamericano (R$ 98,6 milhões).

O Postalis, instituto de seguridade dos funcionários dos Correios, investiu R$ 15 milhões em CDBs (títulos de renda fixa) do Banco Rural, resgatados em fevereiro, e outros R$ 70 milhões num Fundo de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDC) do BMG. O fundo também tinha R$ 30 milhões em investimentos no Banco Santos, que viraram pó com a falência do banco.

José de Souza Teixeira, que está à frente do Postalis desde 1995, minimiza os riscos assumidos quando decidiu trabalhar com esses bancos. Até porque, argumenta, não era possível prever a liquidação ou o envolvimento dessas instituições em um escândalo.

Convidado para o cargo pelo então ministro de FHC Sérgio Motta, o diretor-presidente do Postalis diz ter relação exclusivamente técnica com esses bancos. A decisão de investir, segundo ele, veio das atraentes perspectivas de rentabilidade. "Em tempo algum recebemos sequer uma insinuação ou outro tipo de pressão política em relação ao patrimônio do Postalis. Não posso impedir que peçam, mas recusamos o que tem de ser recusado", disse Teixeira, lembrando que o Postalis lida com pelo menos outros dez bancos.

CONSELHO

O argumento de que os investimentos são direcionados por um conselho financeiro é lançado por praticamente todos os dirigentes dos fundos. É o que diz Marcos Elias, atuário que assessora a direção do Nucleos, a previdência complementar dos funcionários das Indústrias Nucleares do Brasil (INB), para justificar os péssimos resultados da política de investimentos adotada pelo fundo no ano passado.

O Nucleos teve um prejuízo de cerca de R$ 22 milhões em 2004 e atingiu menos da metade da meta de rendimento mínimo, que era de 12%. Entre seus investimentos, o fundo tinha em sua carteira, administrada pelo Banco do Brasil, CDBs do Banco Rural no valor de R$ 615 mil. O fundo não comprou papéis do BMG, mas perdeu quase R$ 7 mil investidos no Banco Santos.

"Foi um erro de estratégia. O conselho deliberativo é composto por 3 membros eleitos pelos participantes e 3 indicados pela patrocinadora. Ele aprova a política de investimentos e a diretoria executa. Não há questionamento dos conselheiros em nenhuma das atas do conselho", diz Elias. "Do ponto de vista técnico, não consigo imaginar como o Nucleos poderia ser usado."

Márcio Cavour, diretor financeiro do Eletros, o fundo dos empregados da Eletrobrás, também fala com naturalidade sobre os investimentos feitos no Rural e no BMG, com os quais, segundo ele, a fundação trabalha desde 1994. No Rural, o Eletros tinha R$ 8 milhões em CDBs, resgatados ainda no ano passado. O fundo fez este mês o último resgate, de R$ 15 milhões, em CDBs do BMG.

No demonstrativo de investimentos do Fapes, a fundação dos funcionários do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), referente ao primeiro trimestre de 2005, aparecem R$ 11,15 milhões investidos em um FIDC do BMG. O documento ainda registra a perda de R$ 2,9 milhões investidos no Banco Santos, mas a direção do fundo não atendeu ao Estado para confirmar os dados.

PETROS

Os dois maiores fundos de pensão de estatais do País, a Previ e a Petros, dos funcionários do Banco do Brasil e da Petrobrás, respectivamente, garantem que não têm aplicações relevantes nos dois bancos mais citados no escândalo do mensalão, BMG e Rural. A Previ informa que zerou todos os recursos aplicados nos dois bancos.

No caso da Petros, a fundação garante que só possui aplicações nos dois bancos através de gestão terceirizada, cuja decisão de aplicação é do gestor. "Esses possuem CDBs do Banco BMG", informa a Petros.

Segundo o fundo de pensão dos funcionários da Petrobrás, dos atuais 13 gestores terceirizados, 5 possuem papéis do BMG, totalizando R$ 30,2 milhões, representando 0,12% do patrimônio.

Entre todos os fundos consultados, somente o Refer, fundo dos funcionários da Rede Ferroviária Nacional, declarou não ter feito nenhuma aplicação nas instituições citadas.