Título: Trégua entre Israel e palestinos nasce sob uma sombra: radicais não aderem
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/02/2005, Internacional, p. A10

Os líderes palestinos e israelense se comprometeram ontem a pôr fim a toda violência de um povo contra o outro e retomar as negociações de paz interrompidas depois do lançamento do último plano de paz, o mapa da estrada, em junho de 2003. Os dois lados vão pôr em prática um cessar-fogo e adotar várias medidas de distensão (ler abaixo). Com as bandeiras palestina e israelense ondeando perto uma da outra no balneário egípcio de Sharm el-Sheik, o primeiro-ministro de Israel, Ariel Sharon, e o presidente da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas, sorriam ao se dirigir à mesa de negociações, das quais tomaram parte o presidente do Egito, Hosni Mubarak e o rei da Jordânia, Abdala.

"Concordamos em deter todos os atos violentos contra palestinos e israelenses, onde quer que eles estejam", declarou Abbas. "Concordamos que todos os palestinos pararão todos os atos de violência contra todos os israelenses em todas as partes. Ao mesmo tempo, Israel cessará todas suas atividades militares contra todos os palestinos em todas as parte", disse Sharon. "Garanto que temos a verdadeira intenção de respeitar seus direitos de viver independentemente e com dignidade."

Mas, apesar das declarações mútuas, uma sombra ainda paira sobre a histórica cúpula, a primeira da qual Abbas toma parte como sucessor de Yasser Arafat: líderes dos grupos radicais Hamas e Jihad Islâmica disseram que precisam ver o que ocorrerá antes de decidirem acatar a trégua.

Um representante do Hamas afirmo que o acordo foi feito apenas pela AP e seu grupo não está obrigado a respeitá-lo. Não está claro, porém, se Abbas tem algum acordo informal com os grupos islâmicos para que ponham fim aos ataques.

Como parte do compromisso entre Abbas e Sharon, Israel irá devolver o controle de cinco cidades da Cisjordânia à AP e libertar 500 prisioneiros palestinos. Outros 400 serão soltos em breve.

Um comunicado do governo israelense informou que domingo será estudada a relação dos que serão soltos, que incluirá Qassan Barghuti, filho de Marwan Barghuti, líder da facção Fatah na Cisjordânia. Marwan Barghuti cumpre pena de prisão perpétua em Israel. Ontem também, um comitê parlamentar israelense aprovou uma lei autorizando Sharon a retirar o Exército e as colônias da Faixa de Gaza e de uma pequena área na Cisjordânia.

"Certamente, a grande quantidade de tentativas fracassadas para aproveitar oportunidades históricas deveria representar um sinal muito forte de que ainda há um duro caminho no Oriente Médio", ponderou a secretária americana de Estado, Condoleezza Rice, durante visita à França. Mas Condoleezza disse que desta vez há diferenças fundamentais, como "uma nova direção palestina que não acredita na violência como caminho para a paz".

Em Israel e nos territórios ocupados, a população, cansada do conflito e de acordos fracassados, não pareceu entusiasmada. "Durante esta intifada perdi todos os meus direitos como ser humano: direito a trabalhar, direito a movimentar-me", disse Mohammed Khader, de 40 anos, varredor de ruas em Ramallah.

"Creio que haverá um período de calma", disse Israel Daniel, de 37, gerente de uma livraria em Jerusalém. "Ambas as partes chegaram à conclusão de que a força não leva à nada. Mas estou cético quanto às possibilidades de paz."

Em Brasília, o Ministério das Relações Exteriores destacou ter recebido positivamente a informação sobre os entendimentos entre os governos da Palestina e de Israel. O Brasil sempre se manifestou em favor da criação de um Estado Palestino soberano, com fronteiras definidas e seriamente capaz de reconhecer o Estado de Israel.